Carol Canabarro
Como o cruzamento das pontas de uma mesma linha, nos tornamos laços. Somos intersecções sutis, reforçadas pela presença diária ou pela lembrança de alegrias imperecíveis. Sem esforço, quando percebemos, estamos emaranhadas uma na outra.
Encontros que, se marcados, talvez não acontecessem. Elas chegam de maneira inesperada e permanecem como bem querem. Não se preocupam em parecer, porque sabem a relevância do ser. Sem máscaras ou maquiagens. Umas surgem em sua porta de cabelo despenteado e incertezas, outras com um bolo recém assado e potes de paciência a tiracolo.
As mais afortunadas acham-nas em memes compartilhados na madrugada, em cartas amareladas do milênio passado ou em abraços no saguão do hospital. Elas estão lá, como sentinelas.
Por princípio, dão mais do que almejam receber. Em retorno, ganham o dobro. E fazem surgir uma nova dobra na fita.
Você sabe que se pertencem quando a mente corre em sua direção para compartilhar uma notícia boa e, na mesma velocidade, as procura para dividir uma desilusão. Algumas te oferecem colo, outras abrem uma, duas, seis cervejas. Todas diminuem sua dor e aumentam sua paz.
Podem ser feitas das mesmas coisas – rendendo horas de conversa, ou de coisas completamente diferentes – rendendo horas de ensinamento. São as que pedem ajuda na hora da mudança ou, com poucas palavras, te fazem mudar por completo.
Tem aquelas que sedem a senha do streaming, outras que não se importam quando roubamos um de seus livros preferidos. Há as sócias da clínica de terapia e as que nem exorcismo resolve. As que dão ótimos conselhos, mesmo com a própria casa bagunçada e as que fazem dos problemas nova piada. Umas acertam todo ano no presente e outras nunca lembram o dia certo do seu aniversário.
“Vou te fazer um reiki”, diz uma delas. “Bora viajar”, replica a outra. Todos os caminhos te purificam. São as mesmas que reconhecem que algo está fora do esquadro quando as figurinhas começam a minguar na tela do celular. Te resgatam. Olham suas cicatrizes não como defeitos, mas como enfeites.
A junção delas forma seu Supremo Tribunal. Aprovam ou não suas atitudes, seus relacionamentos. Narciso não vinga onde estão plantadas.
As que rezam, fazem questão de te colocar em suas orações. Não importa no que você acredita, a fé delas vale por duas. Deixam que você batize seus filhos com água encanada, bordam seu nome em uma toalha, viram personagens dos seus textos. Tomam para si as suas derrotas e comemoram suas conquistas como se elas próprias tivessem vencido. Elas são você.
Se a dor é tanta que as lágrimas te fogem do rosto, elas emprestam as suas. Guardam seus segredos como tesouros preciosos ganhados numa quermesse. Dizem o que você precisa ouvir e sabem calar quando não há nada a ser dito. Abrandam vulcões dentro de um abraço.
Num outro mundo, construiríamos para elas um panteão. Feito de estátuas do tamanho que as vemos, maiores do que pensam ser. Rebatizaríamos as estrelas com seus nomes, para que, as que vierem depois, saibam que o laço que nos une é inquebrantável. Feito de vidas entrelaçadas.