Primeira live: a visita de uma velha conhecida


Carol Canabarro

Assisti, do lado seguro da tela, ao boom das reuniões online e das lives durante a pandemia. Meu trabalho, naquela época, não demandava interação com o público. Éramos meus colegas e eu, estudando gráficos 24 horas por dia. Redes sociais? Nem tinha. Meu maior desafio foi baixar o Discord, de resto, estava adaptada.

O loockdown acabou, mudei de profissão e me deparei com um mercado de trabalho que naturalizou câmeras, ring lights e número de seguidores para determinar se um profissional é bom ou não. Independente da área de atuação, o mundo virtual se tornou realidade. Ou você está nele, ou não está em lugar nenhum. Entrei.

Me joguei na rede social (Instagram) que me pareceu mais adequada a alguém como eu, Millenium, como vim a saber nos stories outro dia. Logo que cheguei, me senti pescando com um caniço na beira de uma poça, enquanto a galera ao meu redor estava de rede, em alto mar, com um barco pilotado pela Inteligência Artificial. Eu escrevia em papiro, eles usavam emojis.

Não demorou para eu perceber que precisava aprender, e rápido, porque a lição de hoje não é a mesma de amanhã. Desde então, venho aceitando todos os desafios que surgem. Semana passada, participei da minha primeira live sobre escrita.

Nova na profissão, novo contato com a tecnologia. Imagino que vocês já saibam o resultado. O mediador e a colega que dividiam o “palco” comigo pareciam pilotos de Fórmula 1, com mudanças de marchas precisas, pit-stops velozes e ultrapassagens geniais. Eu? Empurrava um carrinho de mão enferrujado.

Logo depois do encontro terminar, as críticas vieram depressa. Amigos sinceros, familiares afiados e, claro, o temível espelho.

Meu primeiro pensamento foi “sou um fracasso”, seguido de “como você pode errar o narrador do próprio livro?”, acompanhado de perto de “que expressão tosca foi aquela?” e finalizei com “tem certeza de que quer ser escritora?”. Mesa posta, a Síndrome da Impostora apareceu. Convidei a “Sisi” para sentar.

Com sorriso de Monalisa, quis saber se eu não ia comentar nada. Agora perde as palavras como aconteceu na live, zombou. Respirei fundo, enchi meu copo, apoiei as costas na cadeira, tomei um gole de cerveja e disparei.

Você lembra quando eu tinha nove anos e fizeram uma reportagem sobre handebol lá no clube? Dentre as filmagens, teve uma comigo arremessando um 7 metros. Era minha primeira vez em frente às câmeras. Lembra onde foi parar a bola? A marca deve estar até hoje no logo do clube, perto do teto. Ela riu.

Naquele dia, você também apareceu. E me fez comentários parecidos com os de hoje. Se fosse por você, eu nunca mais teria pisado em um ginásio ou segurado uma bola de handebol na mão. Mas não te dei ouvidos. E olha tudo o que fiz, por onde andei e aonde cheguei. Me dediquei tanto que, acredite, em praticamente todas as equipes que joguei, fui a batedora oficial de 7 metros. Isso já tem 33 anos. E contando.

Eu sei e até hoje você erra, ela revidou. Dessa vez, a gargalhada foi minha. Lógico! Não tenho a tola ilusão de ser perfeita. Na primeira vez, quase quebrei a luminária do ginásio, mas agora, quando erro, é por centímetros. De nenhum jeito é gol, claro, mas é melhor do que foi em 1992 e será pior do que em 2024. Desde que eu não pare de aprender.

Sisi se contorceu na cadeira. A reportagem no clube, já não deve mais existir. A live da semana passada vai durar enquanto houver lugar na nuvem. As duas estarão para sempre comigo. Um lembrete de que, no começo, os erros mais absurdos são parte do processo. Eu só preciso continuar.

E, quem sabe daqui uns anos, eu resgate essa primeira live e diga: quem diria que, disso, me tornei o que sou hoje.

Ei! Onde você vai? Já está de saída, Sisi?

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Carol Canabarro

E-mail: carolinecanabarro@gmail.com

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