Carol Canabarro
Natal não é uma data fácil para mim. Fui criança nos anos 80 e quem viveu lá lembra o quanto as fantasias de Papai Noel aterrorizavam mais do que a possibilidade de não ganhar presente. Depois, irmão e primos mais velhos fizeram questão de me contar que o Bom Velhinho era invenção dos adultos. O que não foi tão ruim. Eu desconfiava que a visita de um cara cheio de roupa no verão gaúcho só podia ser mentira.
As perdas ao longo dos anos, minguaram os parentes e aumentaram as saudades na noite do dia 24. O olhar parado da minha mãe na janela do nosso apartamento, apertava meu peito magricela. Claro que as brincadeiras de amigo secreto, a música da Simone em looping e a tristeza dos adultos mergulhada em cerveja, minimizavam uma dor que eu nem sabia ter. O dia 25 era melhor, a gente conversava mais baixo, almoçava na casa dos meus avós, brincava com os presentes novos e comia todas as sobremesas que não dávamos conta na noite anterior. Hoje, adulta, sei que a ressaca ajudava a ter os ânimos amenos.
Minha família nunca foi lá muito religiosa, até tive meus momentos de fé. Mas dia a dia, Deus foi ficando mais com a cara de plástico do Papai Noel da minha infância. Difícil comprar a ideia de alguém que tem planos supersecretos (que raramente coincidem com os meus) e, como agravante, se aborrece quando questionado. Mas não pense você que ser ateia é fácil. É o exato oposto.
Por não ter alguém que me puna ou presenteie a depender dos meus atos, torno-me responsável por todas as minhas escolhas. Conheço meus pecados e não me orgulho deles. Os louros, trato de dividir com as pessoas que amo. Se tivesse que escolher uma divindade, teria em casa um altar só com fotos de parentes e amigos.
Mas voltemos a comemoração do aniversário de JC. Aliás, pequeno parêntese: desse cara eu gosto. Não da versão afetada e cheia de melindres, mas do humano, do generoso, do riponga revolucionário, que amava prostitutas, andava com pobres, priorizava as crianças, abraçava doentes e cuidava dos animais. E é aí que o jogo vira.
A possibilidade (ainda que ínfima) de ter existido alguém como ele, abre meus olhos. Ele era puro amor. E isso merece ser celebrado.
Esse ano, pela primeira vez me peguei com o mesmo olhar parado de minha mãe. Peito vazio dói mais do que cheio. Mas aos poucos a gente vai compreendendo que Natal não é sobre presentes ou religião. É uma festa para confraternizar e celebrar as boas memórias. É sobre parar uma noite que seja, olhar para os lados e abraçar aqueles que estão na nossa jornada diária, que pegam na nossa mão quando a gente não sabe o que fazer com elas. Celebrar o que nos une e apaziguar o que nos falta. Juntos.
Por isso, esse ano quando me desejaram “Feliz Natal”, devolvi com o mais sincero “Feliz Natal para você também”. Não sei se pelo fato de, hoje, as fantasias de Papai Noel estarem menos assustadoras ou se foi porque aprendi o verdadeiro sentido da festa.